O chunga e o pica.....
A minha irmã deu, no natal, dois peixes à nossa filha. Obviamente que fiquei encarregado de cuidar dos peixes (até porque a irmã é minha, como a minha mulher me relembrou, obrigado mana..) No entanto descobri que não custava muito dar conta do recado, até nos lembrarmos, no inicio do ano, que ainda ninguém tinha dado de comer aos peixes. A partir daí percebi que havia uma diferença entre o protector de ecrã do meu computador e os peixes, aos quais carinhosamente chamei de chunga e pica. Ora bem, o chunga é um gajo que não gosta que violem o seu espaço, para além de ter o dobro do tamanho do pica. Ora como o aquário tem um espaço um pouco limitado, o chunga considera que o seu espaço socialmente aceite, está sempre a ser violado, o que faz com que ande sempre atrás do pica. Há umas noites atrás começamos a ouvir o barulho de pedrinhas a bater no vidro do aquário, isto a horas menos próprias, quando fui ver o que se passava encontrei-os muito sossegados, embora a partir desse dia o pica começasse a nadar ligeiramente de lado, tendência que se foi acentuando com o passar das noites. Certa noite algo de mais esquisito aconteceu, depois de o “normal” barulho das pedras, houve um splash estranho, corri a ver o que se passava e vi o pica a estrebuchar no chão da cozinha. Tratou-se da sua primeira tentativa de suicídio. Pelo menos foi a conclusão a que cheguei após começar a vê-lo demasiadas vezes com a boca de fora da água. Eu já não conseguia ver mais aqueles olhos esgazeados a olharem para mim em busca de ajuda. Um dia decidi dar ao pica um novo começo, até porque já me estava a fazer impressão vê-lo a nadar “de pernas para o ar”. Arranjei um recipiente e pu-lo lá. Para que ele pudesse recuperar a sua auto estima (até porque tenho a impressão que havia ali violência sexual) afastei-o o mais possível do aquário onde estava o chunga, para que ele não o conseguisse ver. Aos poucos começou a voltar ao normal, ou seja, deixou de tentar saltar para fora da água e pude, finalmente, retirar a tampa de cima do seu recipiente.
Passados mais uns tempos, resolvi voltar a juntá-los para ver como as coisas iriam correr (até porque já estava farto de ter que lavar dois recipientes). Estava tudo a correr bem, até que aconteceu um desastre. Tinha já limpo o aquário e estavam já os dois lá dentro, quando a nossa filha resolveu me ajudar a pôr o aquário no seu sítio, resultado, uma inundação, choros e gritos da nossa filha por estar toda molhada, e eu desesperado à procura do chunga e do pica no meio da loiça que eu “deveria de ter já arrumado na máquina de lavar”, como me relembrou a minha mulher. Finalmente, entre os restos de esparguete e do sumo, lá encontrei o chunga, mas do pica, nada. Vasculhei a loiça toda e finalmente, após a segunda volta, fui encontrar o pica dentro do copo da minha mulher, o qual continha ainda uma quantidade razoável de vinho (misturado com a água do estouro do aquário). Ainda estrebuchava, mas vi pelos seus olhos que não iria ficar connosco muito mais tempo. Assim foi. Passados poucos minutos o pica partiu.....
Como a nossa filha aprendeu na escola, que quando os peixes morrem têm que ser postos em álcool (isto porque todas as semanas, na escola, morre um e a professora deve de querer saber porquê e deve, por isso, estar a pensar em autopsiá-los). Lá convenceu a minha mulher a pôr o pica num frasco com álcool, NA COZINHA que é para eu, todos os dias, o encarar sempre que vamos comer e me recordar do seu martírio.
Penso que a verdadeira razão é para ver se eu fico sem apetite e se emagreço.
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