sábado, dezembro 31, 2005

Capitulo III – A noite de Natal…..

Resolvemos (pausa para rir) ir passar a noite de Natal a Paris, não por razões românticas mas porque parte da família da minha mulher mora por lá. Mais uma vez foi preciso fazer malas, mas como era só por quatro dias, passaram apenas meio dia a fazê-las e consegui lá colocar, sem grandes problemas, o meu pequeno saco com a minha roupa.
Como a viagem era longa (cerca de 6 horas e meia) decidiu-se almoçar algo de ligeiro, de forma a sairmos o mais rapidamente possível. Propus telefonar para uma pizaria, proposta que foi aceite graças ao peso que os gritos dos meus sobrinhos têm nas decisões familiares. Por esta altura já a fome apertava, pois fui acordado cedo com os berros que ecoavam por toda a casa, sobre a roupa que as minhas duas sobrinhas queriam levar e a roupa que a minha cunhada queria que elas levassem.
Continuando. Infelizmente a pizaria estava fechada por ser véspera de Natal, pelo que decidimos (pausa para chorar) comer mesmo algo de ligeiro e seguir viagem de imediato. Entende-se por algo de ligeiro, iogurtes e os bocados de pão que sobraram do pequeno-almoço. Lá fomos então para a viagem de carro, com a minha pobre barriga forçada a uma dieta, mas com fortes expectativas sobre o faustoso jantar que nos aguardava. Parámos apenas uma vez, para lanchar algo que a minha mulher tinha preparado, ou seja, iogurtes e bocados de pão que tinham sobrado do pequeno-almoço. Ainda consegui comprar, à socapa, um pacote de bolachas, na estação de serviço, mas só consegui comer duas, pois o resto foi comido pelos meus sobrinhos e pela minha filha.
Chegámos finalmente à casa da prima da minha mulher, nos arredores de Paris. Como a janta era para ser em casa de um outro primo e já estávamos atrasados, só houve tempo para descarregar as malas e partir. Bem que havia lá filhoses, coisa que não aprecio muito, mas com a fome com que estava, perdi a vergonha e perguntei se não podia comer um, ou dois, ou até uns três. Foi-me dito que era apenas para a ceia de Natal, pelo que a minha barriga continuou vazia. Lá chegámos à casa onde ia decorrer o repasto. Só tinha olhos para a mesa. Estava coberta de deliciosas iguarias e todas maricas: pirâmides de camarão, rolos de presunto perfeitamente enquadrados nos pratos, e uma série de outras tretas esquisitas, mas que na altura me pareceram extremamente apetitosas (assim como umas primas quaisquer que por lá estavam). Pensei que tinha chegado ao fim o meu martírio. È dada ordem para nos sentarmos. Eis quando um jovem adulto (primo em sei lá quantos graus da minha mulher) agarra numa garrafa de vinho e se dirige com ela para o seu lugar. Aparentemente o moço tem por hábito embebedar-se nestas festas familiares e estragar tudo, pelo que a mãe do moço tentou persuadi-lo a beber apenas água ou sumo. Bom, iniciou-se uma discussão que se foi alastrando por toda a família e que trouxe ao cimo vários podres da mesma, e que se eu percebesse algo do Francês brejeiro que por ali se falou, de certeza que poderia utilizar, no futuro, contra a minha sogra. Para abreviar, a coisa acabou com portas a bater, carros a guinchar na estrada e com um daqueles silêncios confrangedores, cortado apenas pelo soluçar ritmado da dona de casa. Todos os que ficaram, olhavam para o chão sem saber o que fazer. Até que……um estranho barulho de algo a ser arrasado, fez com que todos esses olhos, se dirigissem para mim…..vermelho e com um camarão na mão…..com a fome nem reparei que o raio do camarão que tirei, quando todos olhavam para o chão, estava preso a outros, tendo assim desfeito toda a “famosa” pirâmide de camarões.
O que podia um pobre esfomeado como eu fazer depois disto? Já pouco ou nada tinha a perder, pelo que “descasquei” o camarão e meti-o na boca, dizendo depois, no meu melhor francês:
- Je espere que le reste du mange va etre aussi bon qui cette corvete.
Estranhamente, isto fez apenas com que o volume dos soluços da dona de casa aumentasse exponencialmente.